Confirmadíssimo: os vegetais afastam a ameaça de vários tumores. Sem contar que, ao incrementar as porções de frutas e hortaliças no prato, sobra literalmente menos espaço para a gordura — e ela tem tudo a ver com o surgimento da doença
por CIDA DE OLIVEIRA
Não tire conclusões precipitadas: os alimentos destas páginas não são milagrosos. Mas a ciência da nutrição, que investiga sua ação anticancerígena, constata que eles de fato têm efeito preventivo. “Vários levantamentos estatísticos apontam, e não é de hoje, que nas pessoas habituadas a devorar vegetais os casos de câncer são mais raros”, garante o gastrenterologista Dan Linetzky Waitzberg, professor da Universidade de São Paulo. Mas, na hora do ver para crer, isso só era observado em tubos de ensaio, nos chamados testes in vitro. Só agora é que os pesquisadores passaram a enxergar o mecanismo antitumor de vários nutrientes dentro de organismos vivos — no caso, cobaias. É um belo avanço.
Na Universidade de Minnesota, nos Estados Unidos, por exemplo, concluiu-se que o sulforafane, presente na família dos crucíferos — couves, brócolis, repolhos —, é capaz de brecar o avanço do câncer colorretal em animais de laboratório. Já em Taiwan, cientistas da Universidade Nacional Chung Hsing testaram o licopeno em animais, nos quais provocaram de propósito um câncer de fígado igual ao que acomete os seres humanos. O resultado? O pigmento que dá o tom vermelho ao tomate e a frutas como a goiaba simplesmente barrou a temida metástase, ou seja, impediu que as células malignas se espalhassem pelo corpo.
A essa altura, você deve estar se perguntando: por que certos nutrientes funcionam contra um tipo específico de tumor mas são praticamente inertes contra outros? Nem os cientistas têm respostas prontas, embora arrisquem algumas hipóteses. Uma delas é a facilidade de alguns tecidos para acumular determinadas substâncias, criando verdadeiras reservas. É o caso do licopeno, o tal pigmento vermelho dos vegetais. Os pesquisadores notam que ele tem uma afinidade especial com os tecidos da próstata e das mamas, ficando concentrado bem ali, enquanto passa depressa por outras partes do corpo — talvez sem o tempo necessário para agir. O resveratrol da uva e do vinho, por sua vez, tende a ficar no plasma do sangue e nos tecidos do sistema urinário. Já compostos fenólicos, como o allium, que está na cebola, no alho e na cebolinha, fariam escala no estômago e no intestino, atuando em diferentes etapas do processo que leva ao câncer nesses órgãos. No entanto, não movem uma palha contra tumores em outras regiões.
Pode parecer confuso — e é. Não tente decorar quanto deve comer disso ou daquilo, como se a travessa à mesa fosse um vidro de remédio. O grande mérito de tantas pesquisas é ensinar — aos médicos, inclusive — que um cardápio adequado (leia-se bem colorido também) pode prevenir 30% dos casos de câncer, incluídos aí tumores de boca, laringe, faringe, estômago e intestino, muito freqüentes na população brasileira. Já é um feito e tanto se a gente pensar que, não faz muito tempo assim, ninguém achava que havia um caminho seguro para prevenir essa doença — muito menos desconfiava que ele estaria no prato. “Hoje se tem clareza da importância de comer frutas, verduras, legumes e peixes, limitando ao mesmo tempo as porções de carnes vermelhas, sal e embutidos”, resume Dan Linetzky Waitzberg. Segundo Sueli Couto, nutricionista do Instituto Nacional de Câncer, o Inca, sediado no Rio de Janeiro, a questão não é quantidade de vegetais, mas regularidade. “Tem de comer sempre”, declara. “No mínimo, cinco porções diárias, preferindo sempre grãos integrais aos refinados.”
Do mesmo modo que sobram evidências de que vitaminas, minerais, fibras e outras substâncias presentes em frutas e hortaliças podem barrar o avanço de tantos tipos de tumor, há provas suficientes para incriminar o álcool, os embutidos e as gorduras, especialmente as das carnes vermelhas. Estas — ressalve-se — têm também seu lado bom, fornecendo proteínas de excelente qualidade, ferro, zinco e vitaminas B12. Não se trata, portanto, de bani-las do menu. “A recomendação é reduzir a ingestão para duas porções semanais”, diz Sueli Couto, do Inca. Ela, no entanto, insiste: “Pior do que comer carne sempre, é não comer salada nunca”.
Além de repletas de substâncias protetoras, as saladas tornam a refeição mais light. E, embora não haja consenso em torno do assunto, a gordura corporal vem sendo examinada com desconfiança. O peso extra, dizem cientistas — como os que observaram isso em ratos, na Universidade do Texas, nos Estados Unidos — contribui para reações inflamatórias dentro do organismo. Até há pouco tempo, essas reações só eram associadas a doenças cardiovasculares. “Hoje se sabe que elas podem aumentar em 30% as chances de um câncer aparecer”, afirma Alfredo Halpern. Portanto, a melhor dieta anticâncer é aquela leve, bem leve.
Vai um suplemento aí?
Diga não se você adota uma dieta balanceada. A menos, claro, que um médico ou um nutricionista recomende, avaliando bem os seus hábitos à mesa. Sem esse olhar, você corre o risco de engolir, em cápsulas, altas doses de um nutriente em detrimento de outros. E isso, por sua vez, pode acabar com o balanceamento das substâncias protetoras no organismo. Ou seja, você fi ca sem escudo contra o câncer.
SINAL VERDE
Ele se acende principalmente para alimentos cheios de fibras e substâncias antioxidantes
CÂNCER DE PRÓSTATA
A abóbora, lado a lado com a cenoura, é famosa pela concentração de betacaroteno. Afi rmar que essa substância protege contra os tão (mal)falados radicais livres não é chover no molhado. Ela ajuda mesmo a restaurar o DNA de células danifi cadas por agentes químicos, físicos ou biológicos. Quando o dano no material genético de nossas células acontece, abre-se o caminho para a reprodução desenfreada de exemplares defeituosos — eis o câncer. É possível que o betacaroteno aja positivamente contra muitos tipos de tumor, mas um trabalho recente da respeitadíssima Universidade de São Paulo avalizou suas benesses especifi camente para a glândula masculina. Outros estudos apontam que o tomate, o feijão, a lentilha, a ervilha, as uvas vermelhas, as amoras e a soja também reforçam as defesas dos homens contra esse câncer — mas, aí, tudo o que a ciência conhece é a relação entre o hábito de comê-los e o aparecimento mais raro dessa doença, sem entender direito qual seria a relação direta.
CÂNCER COLORRETAL
Cientistas da Universidade de Nova Jersey, nos Estados Unidos, provaram que é possível reduzir um câncer colorretal já existente consumindo verduras crucíferas, como a couve-manteiga e sua prima couve-fl or. Fazem ainda parte da família o repolho e os brócolis. Os pesquisadores viram essa redução com os próprios olhos — ao menos em ratos. E atribuem o efeito a um componente desses vegetais chamado sulforafane. “Outra pesquisa com 520 mil europeus apontou uma queda de 40% no risco dessa doença entre aqueles que não deixavam faltar no prato, uma vez ao dia, pelo menos uma dessas crucíferas”, relata Benedito Mauro Rossi, oncologista do Hospital do Câncer, em São Paulo. O efeito do sulforafane, aliás, parece potencializado à medida que aumentam os teores de fi bras no cardápio, quando comemos outras folhas, como rúcula ou espinafre, e desfrutamos, por exemplo, de uma laranja como sobremesa.
CÂNCER DE MAMA
As fibras, abundantes na melancia, por exemplo, são poderosas contra esse tipo de tumor. Uma das explicações é que elas passam mais lentamente pelo aparelho digestório, o que aumenta a saciedade e, por tabela, diminui a vontade de cair de boca em açúcares e gorduras. O risco de quilos a mais, assim, despenca. “O excesso de peso tem ligação estreita com o aparecimento da doença nas glândulas mamárias, sobretudo em mulheres que já passaram pela menopausa”, afi rma o endocrinologista Alfredo Halpern, do Hospital das Clínicas de São Paulo. Entre outros motivos porque, quando há muita gordura, o corpo tem matéria-prima à vontade para fabricar hormônios que alimentam o tumor. Bem, se as frutas da dieta têm muitas fi bras e ainda por cima são vermelhas — como a melancia do nosso exemplo —, tanto melhor. O consumo regular de licopeno, o pigmento vegetal dessa cor, anda cada vez mais associado à baixa incidência desse câncer.
Também são fortes os sinais de que os polifenóis estão ligados à proteção das mamas. Daí a recomendação dos cientistas de que as mulheres consumam toda semana suas fontes — uvas vermelhas, amora, morango, cereja, vinho tinto... Quanto às isofl avonas, célebres componentes da soja, elas também atuam pra valer contra esse tumor. Na última década, diversos estudos, feitos sobretudo com populações orientais, confi rmaram o elo entre o alto consumo do grão e a baixa incidência de câncer de mama e — atenção — de próstata também!
SINAL VERMELHO
Pode parar! Álcool, sal, carne vermelha e embutidos além das quantidades recomendadas estão fortemente relacionados a vários tipos de tumor
BEBIDA ALCOÓLICA
Diversos estudos associam álcool ao câncer de boca, esôfago, fígado, reto e, muito possivelmente, ao de mama também. As evidências tornaram-se mais fortes dos anos 1990 para cá. O Instituto Nacional para a Pesquisa do Câncer, nos Estados Unidos, recomenda que os homens ingiram, no máximo, dois drinques por dia. Já as mulheres, apenas um. Os cientistas ainda estão pesquisando como o álcool causa a doença. No caso do aparelho digestivo, fi ca mais claro: a agressão é por meio do contato direto com as mucosas. De um jeito ou de outro, o excesso de bebida alcoólica danifi ca o DNA, aumentando as chances de surgirem células malignas.
SAL EM EXCESSO
Ele já carrega má fama porque faz o organismo reter mais água do que deveria, contribuindo, assim, para o aumento da pressão arterial. “Só que, ainda por cima, irrita a mucosa do aparelho digestivo de tal maneira que provoca lesões capazes de evoluir para um câncer”, avisa Sueli Couto. Segundo ela, só afastar o saleiro da mesa não basta. Lembre-se de que a maior concentração do sal está nos alimentos industrializados. Então, evite ao máximo molhos, condimentos, macarrões instantâneos e comida pronta em geral. Prefi ra, de longe, as preparações caseiras.
FUJA DOS EMBUTIDOS
Salsicha, salame, presunto e mortadela — outras armadilhas armadas no prato — são, de longe, os maiores vilões. Não bastasse serem produzidos com carnes vermelhas geralmente muito gordas, ainda levam na fórmula aditivos químicos chamados nitratos, que, no estômago, podem se transformar em nitritos. Estes, por sua vez, se convertem em nitrosaminas, verdadeiros agentes cancerígenos, perigosos sobretudo para o estômago e o esôfago. E atenção: até as carnes brancas perdem suas vantagens nutricionais quando transformadas em embutido. “Como recebem os tais nitritos e são defumadas, também se tornam nocivas”, alerta Benedito Mauro Rossi, oncologista do Hospital do Câncer, em São Paulo.
LIMITE AS CARNES VERMELHAS
E não estamos falando apenas da suculenta picanha da foto. Carne de porco e de cordeiro, assim como as processadas, como hambúrguer, rosbife e bacon, também devem ser limitadas a duas porções semanais. Nos outros dias, coma peixes e aves. O problema é a gordura saturada — que por si só já é um ingrediente cancerígeno — e substâncias que lhe dão cor, como o ferro-heme, ou ferro orgânico, aquele mesmo que combate a anemia. Pesquisas americanas associam sua ingestão excessiva ao aparecimento do câncer colorretal. Quando a carne é esturricada na grelha ou na frigideira, o perigo aumenta. Há uma reação química nesse processo que libera outras substâncias cancerígenas — bem naquela casquinha escura e crocante.
Fonte: Editora Abril
Data: 10/06/2008
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